segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Minha vida

O despreparo me prepara para a autenticidade. Se sou surpreendido no ‘não saber falar’, não tento me explicar, mas apenas digo que não sei dizer, e deixo o que sou falar por mim. Vivo na claridade da serena liberdade de não saber mentir.

Sou amigo dos detalhes, dos poetas, das realidades concretas, abstratas. Sou poeta de rimas pobres, de reticências. Amo a novidade das palavras antigas, sou escritor de versos novos. Recolho as pedras do meu chão, chão que piso com pés descalços. Vejo Deus desenhando estradas ao mesmo tempo em que passo por elas; seu traço é firme, e aos meus olhos, imprevisível. O lugar onde piso é meu destino, destino dos caminhos passados. O amanhã é meu destino de hoje.

Essa é minha vida, subjetiva, relativa, de imagens vagas e versos soltos, que descrevem o que sinto e as pedras que piso. Ando aqui sem saber chegar, descrevo as paisagens sem saber falar, e minhas rimas dizem somente que é bonito o que está perto e o que não vejo. Confio no meu guia, que por aqui andou antes de mim. Meu guia é aquele que desenha as estradas, cartógrafo de mapas que não tenho nem posso ver. É Ele quem compõe meus versos. É Ele a voz que me dita as rimas que cantam a suave melodia da minha vida.

Versificando eu sigo a vida, cantando em prosa o meu caminho, escrevendo em letras miúdas minha história. Escrevendo eu passo por aqui, moldando em versos minha vida, versos que me tecem e me formam, que descrevem esta confusão que insiste em ficar em mim. Meu Senhor me fez sensível a tudo que ouço, olho e sinto, e me manda descrever em letras poucas os presentes que me dá.

Meu Jesus me deu também amigos, e de nós nos fez irmãos, com quem caminho por iguais estradas, de mãos dadas e corações unidos. Vivem comigo a alegria de seguir o único que a esta estrada conhece, o mesmo que a desenha sob nossos pés.

Hoje é dia de celebração, dia de festa de corações que seguem livres e cantam felizes o destino que perseguem. Cantamos alegres a verdade que abraçamos, verdade que a nós se revelou, que nos fez ver os sinais que nos apontam o destino de caminhos que não vemos. Vivemos na claridade da serena liberdade de em Deus querer viver, de verdade viver.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Moral

Parece que falar de regras sempre gera desconforto, mas hoje não estou muito preocupado com isso. A palavra regra ganhou uma conotação negativa e falsa, especialmente quando se trata de regras morais religiosas. Não pretendo criar um conceito definitivo, mas quero iniciar deixando aqui o conceito que norteará esta reflexão: A regra moral é a definição formal do que é naturalmente correto.

Analisando a doutrina moral da Igreja Católica, por exemplo, esse conceito é bastante claro, apesar de, para alguns, as regras dessa doutrina não serem compatíveis com uma realidade mutável. Há aí um erro que nem todos percebem, apesar de bastante nítido. Não há razão para se definir uma regra moral se esta se submeter às alterações de comportamento daqueles a quem será aplicada, mesmo se essas alterações se tornarem tão comuns a ponto de parecer errado, por que menos comum, o que obedece à regra; seria uma solução muito cômoda. As regras morais têm, por definição, um fundamento moral, e não prático, portanto o que proibiam no passado proíbem ainda hoje.

Toda moral consiste num sistema de regras, e a essência de toda moralidade deve ser procurada no respeito que o indivíduo adquire por essas regras”(1). Quando isso não é aplicado, só há obediência à regra enquanto houver vigilância. O que observamos hoje é conseqüência da irresponsabilidade de muitos dos que se comprometeram com o ensino do valor das regras morais, mas negligenciaram tal responsabilidade e se ocuparam em apenas dizer que essas regras deviam ser observadas. Essa imposição retira a liberdade das pessoas, contrariando o Evangelho. Já disse isso aqui e repito, a pregação de Jesus nunca foi uma imposição de valores, mas sempre uma proposta que colocava em evidência a liberdade daquele a quem Ele se dirigia.

O dicionário define moral como “Conjunto de regras de conduta consideradas como válidas, quer de modo absoluto para qualquer tempo ou lugar, quer para grupo ou pessoa determinada.(2). A partir de tudo isso, e sabendo que um indivíduo só pode considerar-se membro de um determinado grupo se aceitar as determinações daquele grupo, inclusive as normas de conduta moral, uma pessoa só pode considerar-se cristã se obedecer, além de outras coisas, às regras morais da religião cristã. Não digo isso para condenar os que seguem regras diferentes das que eu sigo, mas apenas para dizer que ser cristão não é um título ou patente que deva ser ostentada, mas o cristianismo é, antes de tudo, norma de vida.


(1) Jean Piaget
(2) Dicionário Aurélio

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Liberdade

Há muito tempo Deus já me falava das coisas que deveria abandonar para segui-lo. Primeiro minhas vontades. Não me pedia para deixá-las totalmente, mas que as medisse e moderasse, de modo que não me levassem para longe Dele. Depois meu entendimento, para que deixasse de lado o desejo incontrolável que tinha de tudo entender, de tudo absorver com a razão. Por fim minha memória, para que nada do que passou me aprisionasse, e que as boas lembranças não me prendessem no desejo de tê-las comigo outra vez. Por fim, pediu que colocasse meus instintos sob o governo de minha vontade, depois de entregue a ele, de modo que pudesse viver livremente, e não escravizado pelos meus próprios impulsos. Assim me ensinou a desapegar-me daquilo que me agrada e a querer apegar-me somente a Ele.

Ainda restam muitas coisas que preciso deixar, muitas coisas que me retiram a paz quando me afasto delas. Há ainda muitos vícios que precisam cessar, muitos desejos que precisam morrer, muitas vontades que precisam ser domadas.

Em meio a tudo isso, há algumas coisas que não me levam a Deus e, no entanto, não podem ser consideradas más por isso, porque também não me afastam Dele. Essas coisas me tiravam a atenção e eu andava para frente olhando para os lados, e assim tropeçava com mais freqüência. Isso me fez querer descobrir o que aquelas coisas tinham de tão agradável, e de tão importante, a ponto de me fazerem desviar o olhar do que realmente importava. Percebi que aquelas coisas não eram tão importantes assim, e que, se não as olhasse, elas não me fariam falta; entendi, então, que precisava desejar apenas o que me fosse realmente útil, e não mais aquelas coisas que, pelo menos, me faziam perder tempo(1). Aprendi que o que não leva a Deus não merece ser desejado.


(1) “Afasta de ti esses pensamentos inúteis que, pelo menos, te fazem perder o tempo.” (S. Josemaria Escrivá)

terça-feira, 30 de outubro de 2007

Olhando de outro jeito

Estou ainda aprendendo a silenciar, a aquietar os sentidos para estar com Deus. Preciso agora iniciar outro caminho, paralelo a esse, e andar por vias até agora desconhecidas. O silêncio é necessário, mas é caminho, e não resposta. Daí a necessidade desse caminho paralelo, para domar esse silêncio, de modo que não se transforme em indiferença nem alimente uma intolerância contra os outros.
Minha mãe costuma dizer que tudo em excesso faz mal, e o silêncio deve ser considerado assim também, principalmente quando não se tem consciência do seu real significado e sentido. O silêncio não pode ser, em nenhuma circunstância, um mecanismo de defesa; o silêncio não pode ser como uma trincheira, mas deve servir para medir melhor nossas ações e palavras.
Silenciar não pode ser um ato covarde diante de uma situação que nos amedronta, ou de uma fragilidade que tememos que seja vista pelo outro. Quando bem medido, o silêncio é um meio maravilhoso para encontrar-se consigo mesmo e perceber com mais facilidade e clareza os próprios erros e fraquezas, e a melhor forma de lidar com tudo isso; não pode ser alimento para o orgulho. É bom saber demorar a resposta; respostas rápidas demais tendem a ser equivocadas. Silenciar é analisar a vida, e não escondê-la dos outros.
Preciso aprender a medir meu silêncio, e a fazer dele instrumento de trabalho, e não cama de descanso. Silenciando demais me esqueço de viver; silenciando pouco, me esqueço de sonhar.
Preciso saber falar, saber calar, saber viver.

terça-feira, 23 de outubro de 2007

Diferenças

É difícil viver no mundo e conviver com diferenças que agridem. Às vezes eu queria ter o poder de modificar as pessoas e torná-las instantaneamente santas, mas não posso mudar a realidade assim, preciso aprender a conviver com aquilo que me incomoda e provocar mudanças aos poucos. Não posso exigir que o outro viva de acordo com as opções que fiz para viver como vivo, como se o fato de aquele não seguir os preceitos que escolhi fosse sempre um erro. Minha vida não é molde para a vida dos outros e as opções que eu faço não se impõe às pessoas com as quais me relaciono. É uma simples questão de respeito, e não de omissão diante do outro e daquilo que ele faz que é contrário aos valores que escolhi. A pregação de Jesus nunca foi uma imposição de valores, mas sempre uma proposta que colocava em evidência a liberdade daquele a quem Ele se dirigia, e assim deve ser a minha pregação também.
Há uma frase que gosto muito que diz assim: "Sempre que estive entre os homens menos homem voltei" (1). Nisso muitos entendem um desejo de fuga, mas permita-me interpretá-la de outra forma. O mundo tem o terrível costume de se esconder por trás de personagens, alegres e trágicos, e o convívio com pessoas assim é para mim um risco constante de querer ocultar o que sou para ser aceito por um determinado grupo. Importa que não me deixe levar pelo discurso das máscaras, para que minha identidade não se perca. Assim, aquela frase não é uma reflexão pessimista diante de uma realidade, mas é um alerta para que eu não esqueça quem eu sou. "Sempre que estive com Deus mais homem voltei". Essa deve ser minha reflexão a cada dia, e é isso que deve inspirar em mim o desejo de ser mais eu mesmo a cada dia, com Deus. Dizia Santo Agostinho: "Deus é mais eu mesmo do que eu mesmo sou eu mesmo". Que seja assim, não eu, mas Cristo vivendo em mim (2).

(1) Sêneca, Epist. 7
(2) cf. Gl 2, 20

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Do silêncio ao Silêncio

Nunca falei muito, e por muito tempo não falei
Há muito me calei, e há outro muito me escondi
Por muito tempo vivi sem falar, calado e mudo
Há pouco tempo as primeiras palavras saíram, doídas
Mais uma vez me calei, mas não de todo, e só um pouco falei
Não havia muito a dizer; dentro de caixas livros não servem pra nada
De novo me escondi, para ler em mim os livros que guardei
Deu trabalho. Abri as caixas, tirei a poeira, comecei a ler
Quis parar, mas de tentar não desisti, e meio sem querer continuei
Eram livros grandes de letras miúdas, de frases confusas
Com os olhos cansados quis dormir, mas de tentar não desisti
De tudo que eu lia muita coisa eu já sabia, e não sabia
Eram lembranças, passados, presentes, vidas, amigos
Ali eu me entreti e não quis mais parar, me forcei continuar
E nas palavras que li um outro silêncio eu encontrei.
Continuei calado, pensando cada palavra que li, cada letra que vi
E já cansado, depois de ler tantos livros, fui dormir
Vivi de novo o que morreu, e as lições passadas se fizeram novas
Acordei, me levantei, e vi a vida de outro jeito
E as palavras que temia, das quais fugia, faziam agora parte de mim
Palavras que me recordam quem eu sou
Que me mostram a vida em pequenos pedaços de papel
Palavras que são ditas e passam, uma a uma, por meus ouvidos
E deixam em mim um pequenino desejo de ouvi-las de novo
E criam em mim um grande desejo de novas ouvir
Lembrei-me de Cristo, que pouco falava com sábias palavras
Lembrei-me de Cristo, que muito falava com poucas palavras
Sigo o exemplo de meu mestre, que sabe dizer o desejo dos corações
Sigo a Jesus, que sabe falar o que as almas precisam ouvir
Que sabe silenciar e num olhar tudo dizer
Que sabe falar e com uma palavra tudo criar
Diante Dele me calei, e nada mais eu quis dizer
Num olhar eu pedi que Ele falasse por mim
As mesmas palavras que precisava ouvir
Me deu o dom de escrever e dizer pobres palavras
Que encerram em si o que Ele me diz
E assim, silenciando, a falar eu aprendi.

"Só peço a Deus que a trama das palavras
Desperte nossas falas e nos ensine a escrever
Poemas que despertem
Resposta em que não sabe responder"
(Pe. Fábio de Melo, scj., Aventurando)

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Sem querer saber dizer...

Hoje só queria ficar sozinho, longe do barulho do mundo e da conversa das pessoas que gostam de fazer alarde, que querem saber de tudo antes de acontecer, que perguntam sem querer saber pra parecer que se preocupam. Queria ficar assim, no silêncio, na companhia "solitária" do meu Deus. Não sei dizer o que me fez agir assim, tudo que sei é que não estava no meu estado "normal".
Queria ficar sozinho, e cada vez que tentava encontrar as razões desse sentimento as lágrimas me roubavam a razão, mas não quis deixá-las cair, como se tivesse medo que elas fossem me ferir o rosto, ou que atrairiam os olhares e a reprovação dos homens. Queria poder deixar sair, mas ainda tenho medo de ouvir perguntas que não quero responder, ou de ouvir respostas que não quero ouvir.
Ainda não entendi bem o que Deus quer me chamando assim, e nem sei se quero entender. Tudo que quero hoje é ficar sozinho, e aprender de Deus o silêncio que por tanto tempo procurei nos lugares errados. Não o silêncio de calar-se, nem o silêncio de saber ouvir, mas o silêncio, talvez o mais puro de todos, o simples silêncio que permanece quieto sem querer dizer nem ouvir, mas apenas olhar.

"Chegou como quem chega pra ficar
Chamou meu nome, me estendeu a mão
E perguntou-me se eu queria ir
Um pouco além do que já pude ir

Não sei dizer ao certo como foi
Tampouco sei o que Ele viu em mim
Só sei dizer que já não posso mais
Ser o que sou se Ele não for em mim"
(
Pe. Fábio de Melo, scj. - Chegada)

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Curtas, poucas palavras...

Se a esperança não morreu dentro de nós é porque ainda acreditamos em um final feliz. Nesse ponto os contos de fadas tem um pouco de verdade, viver feliz para sempre não é uma utopia que deve ser esquecida em histórias infantis, mas é a verdade do cristianismo, e é nisso que acreditamos. Se não acreditamos num final feliz não podemos nos dizer cristãos, porque Cristo é o nosso final feliz. A morte que nos causa tanto temor deveria ser para nós o momento mais desejado, porque então nos uniremos a Deus para nunca mais nos afastarmos Dele. É nessa esperança que encontramos sentido para tudo que passamos nessa vida, e é aquele final feliz que esperamos que nos faz ter a coragem de seguir em frente.
O início se esconde atrás do final e a lágrima que molha um rosto triste rega a felicidade que no fim germinará e não morrerá.

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Recomeços

Recomeçar é sempre difícil, doloroso. É como uma criancinha que, brincando com seus amigos, cai e machuca o joelho. Como é doloroso para ela se levantar e andar de novo; como é grande o medo de causar maior dor ao mover a perna e dobrar o joelho. Aí está a beleza de recomeçar, de superar limites, limites que nós mesmos nos impomos, que não são da nossa natureza, que não fazem parte do que somos. A todo momento há uma voz que nos fala e que nos faz lembrar das vezes em que fracassamos em algum momento de nossa vida, nos fazendo pesar mais a fraqueza que um dia deixamos que nos derrubasse.
Sempre encontramos novas chances corrigir erros antigos, muitas vezes esquecidos, mas, lembrados pela força das conseqüências que nos trouxeram e que nos marcaram, que nos fazem ter medo de tentar de novo, desistimos de vencer nossas fragilidades e nossos medos, e aí erramos.
É preciso ter coragem de enfrentar nossas fragilidades, mesmo quando parecem grandes demais. Ninguém pode tornar-se melhor vivendo "como sempre viveu". Nossos limites são como degraus em uma escada, e se quisermos subir teremos que pisar sobre eles, superá-los, mesmo que nos façam cair algumas vezes e, como aquela criança, tenhamos medo de cair de novo ou de doer mais ao nos levantarmos.

terça-feira, 19 de junho de 2007

Apenas palavras...

Nessa vida tantas vezes me calo e fico em silêncio. Na falta de palavras, às vezes não digo nada; outras vezes digo apenas que não sei o que dizer. É o que digo agora: "Não sei o que dizer".

Muitas vezes esse "não ter o que dizer" não chega a ser ruim. É quando não se sabe o que dizer que as palavras são mais sinceras; é quando não se sabe o que dizer que o coração não segura o choro; é quando não se sabe o que dizer que se pode dizer tudo com apenas um olhar; é quando não se sabe o que dizer que saímos de nossos esconderijos e deixamos cair nossas máscaras.

Foi sem saber o que dizer que vivi muitos de meus dias, sem muitas palavras para expressar o que penso e o que sinto. Esse meu silêncio ficou um pouco esquecido no tempo, e às vezes sinto saudades da paz que sentia, paz que perdi tentando traduzir em palavras o que lágrimas diriam com muito mais clareza.

Na ausência de palavras é o coração que fala. Foi assim que Maria Madalena lavou os pés de Jesus (1), sem saber o que dizer. Foi assim que Maria, irmã de Marta, se sentou ao lado do Mestre para escutar sua doce voz (2), sem saber o que dizer. Foi assim que Pedro chorou seu pecado (3), sem saber o que dizer.

Não ter o que dizer é também ser livre. Palavras prendem, aprisionam o coração no pequeno espaço das palavras. Não digo que falar é ruim, mas permanecer em silêncio, muitas vezes, diz mais do que qualquer palavra poderia tentar exprimir, afinal, são apenas palavras. Num olhar é muito mais fácil pedir perdão. Num olhar é muito mais fácil dizer "podes contar comigo". Num simples olhar é muito mais fácil dizer "eu te amo". Palavras dizem muito, mas são apenas palavras.


(1) Lc 7, 37-38
(2) Lc 10, 38-39
(3) Mt 26, 75

sexta-feira, 27 de abril de 2007

A Páscoa da Eucaristia

Neste tempo de imenso júbilo a vida da Igreja se reveste de novo esplendor, o esplendor do Cristo vivo, ressuscitado. Especialmente neste tempo, a Igreja veste trages de alegria e convida todos os fiéis a participarem desta festa que se estenderá pela eternidade.

A Páscoa é o fundamento da nossa fé, base de nossa esperança. "Se Cristo não ressuscitou dos mortos, vã é a nossa fé" (1). A fé católica se fundamenta na ressurreição do Cristo. Se Cristo estivesse morto, de que adiantaria acreditar e confiar nele? Lançando um olhar mais atento à doutrina de nossa Igreja, percebemos que ela não vê a Ressurreição como um fato distante no qual acreditamos sem dele vermos qualquer sinal; pelo contrário, a Santa Mãe Igreja ensina que o mesmo Jesus que Ressuscitou dos mortos é está na Santíssima Eucaristia, Sacramento do Amor, verdade do amor, essência de Deus(2). Este é precisamente o motivo de toda a alegria da Igreja neste tempo de vida e de luz. Jesus está no Santíssimo Sacramento tal qual está no Céu. Tão vivo e presente quanto estava com os apóstolos. A vida da Igreja está na Eucaristia, a nossa vida está na Eucaristia.

Se Cristo não Ressuscitou dos mortos, vã é a nossa fé. Se a Eucaristia não é o Cristo, vã é a nossa fé. A cada missa é tornado presente o Sacrifício da Cruz, a cada missa a ressurreição de Cristo acontece nos corações daqueles que o recebem com coração puro e humilde. No momento da consagração o Cristo é crucificado; quando rezamos pedindo que o Cordeiro de Deus tenha piedade de nós, o Cristo morre; quando comungamos o Cristo é sepultado em nossos corações; finalmente, se o recebemos dignamente, o Cristo ressuscita em nós.

"O coração do comungante torna-se-lhe o túmulo, pois cessa o estado sacramental ao dissolver-se, sob a ação do calor natural as Santas Espécies: Jesus Hóstia não mais se encontra em nós sacramentalmente. É a morte do sacramento, a consumação do holocausto. Túmulo glorioso no coração do justo, túmulo ignominioso no coração do pecador."(3)

Neste espaço em que falo de minha experiências com Deus não poderia deixar de falar deste tão grande tesouro, a Eucaristia. É incrível como sempre que meu coração está angustiado e longe de Deus a simples presença de Jesus Eucarístico me faz sentir-me melhor; e não só, contemplá-lo no Sacramento, apenas contemplá-lo, sem dizer uma palavra sequer, já é suficiente para não me importar mais com o tamanho das minhas dores, mas apenas com o tamanho do amor que Ele me tem. Jesus na Eucaristia é, além do meu maior tesouro, a razão da minha vida. Mesmo que eu ainda seja bastante infiel, Ele me faz desejar estar com ele. Uma irmã minha costuma repetir o que dizia Santa Teresinha: "Deus me faz desejar aquilo que Ele sempre quis me dar". Quem poderia desejar algo maior? A promessa de Cristo já seria, em si mesma, para nós, criaturas indignas, causa de eterno júbilo, mas Ele quis que tivéssemos mais do que uma promessa, quis que tivéssemos Ele mesmo, seu corpo, sangue, alma e divindade no Santíssimo Sacramento.

Nós Vos adoramos Senhor Jesus Cristo e Vos bendizemos, porque pela Santa Eucaristia alimentais o mundo!

Exultemos de alegria, Cristo está vivo no meio de nós!


Gloria in Excelsis Deo


(1) I Cor 15, 14
(2) Papa Bento XVI, Exortação Apostólica Sacramentum Caritatis
(3) S. Pedro Julião Eymard

segunda-feira, 29 de janeiro de 2007

Aventuremos a vida!

"Aventuremos a vida! Não há quem melhor a guarde que quem a deu por perdida." (1)

Teresa nos exorta a arriscarmos nossas vidas por Cristo, como os apóstolos fizeram, como os santos fizeram, como ela mesma fez. É certo que sofreremos muito, talvez mais do que se não nos aventurássemos, mas "tudo o que se sofre por amor, por amor se cura" (1) .

Penso que para os cristãos, muitas vezes marcados como "esquisitos", deveria ser "esquisito" não ser cristão. É infundado o medo que nós cristãos temos de viver como cristãos de verdade. Esse medo é fruto apenas da situação cômoda em que estamos já há muito tempo; parece-nos mais fácil ficar assim do que arriscar qualquer mudança. Nos julgamos livres para fazermos o que queremos, mas essa liberdade se limita a fazer o que o mundo aprova. É preciso abrir mão de nossas próprias vidas e abraçar a vida do próprio Deus, a vida eterna, vida que venceu a morte, vida que vence a morte.

”No mundo tereis aflições, mas tende confiança! Eu venci o mundo.” (2)

Como podemos ainda desejar com tanta sede as coisas deste mundo se temos diante de nós a Eucaristia? Deus nos deu sua vida, nos fez participantes de sua própria vida no Santíssimo Sacramento. Já não há mais nada a temer, porque Deus habita em nós e Ele vive em nós. A Eucaristia é tudo quanto deveríamos desejar, é o próprio Deus que vem a nós para viver em nós. "Temos o Santíssimo Sacramento, e aí está tudo o de que preciso" (3) .

Adoremos o Cristo crucificado e soframos com Ele, pois este é o caminho por onde se vai ao céu. "Tudo sofre quem olha para Jesus na cruz" (4), porque "não existe um caminho mais seguro para chegar ao paraíso do que o da cruz. O próprio Deus o escolheu" (5) . "A cruz é o trono dos que amam Jesus Cristo de verdade" (6), porque "para ganhar o céu, todo sofrimento é pouco" (7) .

"Tenha sempre uma fé inquebrantável no amor. Se tens que sofrer, prova é de que o Senhor te ama com predileção." (5)

É preciso que nos refugiemos no Peito Chagado de Jesus Cristo, este é o lugar dos verdadeiros adoradores. É preciso recorrer constantemente a Deus, mesmo quando a tentação nos parece fácil de superar. "Orai sem cessar" (8) . "A oração é um diálogo com Deus. Ninguém alcança a própria salvação sem o auxílio de Deus; mas se não orar ninguém merece tal auxílio" (9) .

"Sejam vigilantes, permaneçam firmes na fé, sejam homens, sejam fortes. Façam tudo com amor" (10), porque "quando se ama tudo é alegria, a cruz não pesa, o martírio não se sente, vive-se mais no céu que na terra" (11) .

Vivamos sempre para Deus, vivamos de Deus, vivamos da Eucaristia! "A nossa vida deveria ser eucarística. Nossa mente e nosso coração deveriam entreter-se continuamente com o Santíssimo Sacramento" (12) . "A Santíssima Eucaristia é o Sacramento de amor, prova de amor" (13) .

"Nada mais tenho a dizer-vos. Vós tendes a Eucaristia. Que quereis ainda mais?" (3) .


(1) Santa Teresa D’Ávila
(2) Jo 16, 33
(3) São Pedro Juliao Eymard
(4) Santo Afonso Maria de Ligório
(5) Bem-aventurada Elisabete da Santíssima Trindade
(6) Santa Margarida Maria Alacoque
(7) São José Calazans
(8) I Ts 5, 17
(9) Santo Agostinho
(10) I Cor 16, 13s
(11) Santa Teresa dos Andes
(12) Bem-aventurado José Allamano
(13) Santo Tomás de Aquino

quarta-feira, 24 de janeiro de 2007

Meu Deus, meu Amor, minha Vida...

Quando me afasto de Deus tudo parece ruim. Coisas que costumavam me agradar começam a me aborrecer e o que antes desprezava parece começar a me agradar. Às vezes eu me pergunto por quê eu escolho abraçar as coisas deste mundo e abandonar as coisas do alto. Isso não faz nenhum sentido. Já dizia Jim Elliot: “Não é tolo quem deixa o que não pode guardar para ganhar o que não pode perder” .

Há uma música que diz assim:

”Será que vou acreditar quando disseres:
’Minha mão te guiará por todos os caminhos’?
Será que ouvirei o que dizes
todos os dias, a todo instante?” (1)

Me faço essas perguntas sempre, e quase sempre a resposta é positiva, mas nem sempre ajo de acordo com o “sim” que dei. Parece que minhas respostas servem apenas para não agredir meus próprios ouvidos. Dou a resposta que quero ouvir de mim mesmo, mas não a que eu realmente quero. Seria melhor dizer ‘não’ para não mentir? Longe de mim pensar assim. Melhor seria dizer não, ou não responder ‘sim’ tão prontamente quanto gostaria, por que “tenho necessidade daquele ‘não’ para poder refletir, meditar em todos os ‘prós’ e os ‘contras’” (2) . Queria poder dizer prontamente um ‘sim’ total e verdadeiro como fez Maria, mas enquanto minhas fraquezas ainda me atrasam o passo, que minhas inúmeras negações me façam voltar arrependido e fazer o que Deus pede que eu faça. (3)

”Meu dulcíssimo Jesus Cristo, amor da minha vida, vida da minha vida, minha divina delícia, em quem repousam os mais profundos desejos de minha alma, fazei que eu viva para Vós e que eu saiba servir-vos e amar-vos como quereis que eu vos ame e sirva. Que minha natureza viciada e minha vontade pervertida não me afastem de Vós para sempre. Que vossa mão misericordiosa me proteja sempre e que ao comungar-vos eu deseje ainda mais o Céu. Que vossa presença em mim me torne semelhante a Vós.
Eu Vos adoro, Senhor, e Vos bendigo, porque pela Santa Eucaristia alimentais o mundo.”

(1) Walk by Faith, by Jeremy Camp
(2) João Paulo II, Santa Missa para os Universitários Romanos. 18/12/1979
(3) cf. Mt 21, 28-32