quarta-feira, 9 de outubro de 2013

A tirania dos hipócritas

"O pardal lastima que o pavão tenha cauda tão pesada. (R. Tagore)

Os hipócritas são um tipo interessante, no mínimo. Admira-me o esforço que fazem para parecerem virtuosos diante daqueles que querem que os vejam assim. Chega a causar espanto o empenho desse tipo em construir para si máscaras e personagens que caibam aonde forem: na igreja, um, no bar, outro e na família, ainda mais um.

É um feito admirável o que conseguem. Merecem uma medalha, talvez. Uma homenagem, um ode, uma apologia ou uma página de pessoa pública no Facebook (disso gostariam, provavelmente). Sua fama os precede. Seus rostos sorridentes, suas mãos sempre levantadas em protesto contra os males que assolam o povo, sua presença sempre antecipada em ações comunitárias beneficentes, sua presença sempre notável em trabalhos pastorais e caritativos. Quantas fotos belas para serem publicadas nas redes sociais! Quanta virtude para ser ostentada gratuitamente! Nos seus lábios nunca há uma palavra ofensiva, seus discursos são sempre politicamente corretos, polidos e aceitáveis, desejáveis, floridos e enfeitados com uma oratória invejável.

Mas, os hipócritas são um tipo interessante, volto a dizer. Raramente vivem sozinhos, andam geralmente em bandos, podem ser os amigos santos que andam sempre juntos na Igreja. É como se procurassem desesperadamente por cúmplices e álibis, por outros de si com quem possam ter algum alívio de seu esforço heroico para sustentarem de pé o santo oco.

Curiosos, espantosamente hábeis na arte do pavoneio, são no entanto bastante numerosos, embora nem sempre sejam identificados facilmente: é preciso fazer parte de seu grupo, ser confundido por eles com um deles ou ser cobiçado para ser mais um de seus membros exóticos. Gostam de trocar experiências, de rir-se dos enganados e de gloriar-se dos louvores que recebem pelas virtudes que demonstram. É um clube de narcisos e pavões. Vivem contentes por suas realizações, os ideais esculpidos e ostentados como troféus de sua magnanimidade. Alguns são excessivamente críticos e arvoram-se como juízes severos, como guardiães irrepreensíveis da verdade e da ordem. Outros são mais discretos, mostram-se indulgentes e compassivos, são sempre afáveis e demonstram generosa misericórdia. Nesses dois tipos dividem-se os hipócritas, grupos rivais que dividem e fragilizam seus tronos e púlpitos, dos quais cuidam, cooperativamente, com zelo admirável.

Frequentadores de festas beneficentes e festejos religiosos, encontram ali um momento de alívio para seus esforço, reúne-se o bando e retiram as fantasias e adornos, todos cúmplices do mesmo delito, testemunhas cujo silêncio compra a própria impunidade. Estão ali e em celebrações religiosas, quando ficam sempre à vista de todos, heróis do zelo e da dedicação, da caridade e do compromisso com a Igreja, com Deus e com o padre.